Ed Motta volta aos caminhos ensolarados do AOR
Marcelo Donati, Setembro de 2018.
Em Criterion of the Senses (2018, MustHave/Membran), o compositor, cantor e multi-instrumentista Ed Motta retoma parte do estilo luminoso do disco AOR (2013), apresentando temas que transitam entre o Pop Soul e o Westcoast bem elaborado, com pitadas de disco funk e fusion, sem no entanto abandonar totalmente a veia jazzística registrada no álbum anterior, ‘Perpetual Gateways’ (2016, MustHave/Membran). Com exótica capa e arte feitas pela artista Edna Lopes, o disco traz 8 músicas, e no Brasil será lançado somente em aplicativos e sites de streaming (Spotify, Apple Music, Google Play). Portanto, para obter a edição física (CD ou LP) do novo disco do Colosso do Rio (como Ed é chamado lá fora), será preciso recorrer aos sites internacionais. O lançamento oficial é dia 21 de setembro.
As impressões gerais de cada música:
Lost Connection to Prague
A faixa de abertura cita Kafka num discurso sobre uma viagem mal sucedida para Praga.
Musicalmente, traz lembranças do som levemente quente, vintage e sem muita compressão do disco Chapter 9, com teclados fazendo camadas como arranjos de cordas (todos tocados por Ed), desaguando num solo ‘torto’ do guitarrista Thiago Arruda.
Sweetest Berry
Mais animada, exalando um clima AOR City Pop, com uma estrutura vocal chiclete, ‘Sweetest Berry’ tem potencial para ser single do álbum. A guitarra de Ed com palm mute, o baixo de Paulo Cesar Barros fazendo slides, a percussão esperta de Frank Colon, e um órgão cheio e bonito tocado por Daniel Latorre permeando os arranjos trazem um ar todo alegre para a canção. Foi a primeira música a ser apresentada ao vivo – durante o programa de TV ‘Encontro com Fátima Bernardes’ (Globo).
Novice Never Notice
O piano elétrico da introdução (tocado pelo grande Glauton Campello, R.I.P.) já entrega o clima funk/jazz/fusion da música, exponenciado pelo groove do baterista Sergio Melo e pelo clavinete de Renato Fonseca. O solo de talk box de João Castilho sedimenta o caráter setentista, lembrando de ‘Haitian Divorce’ (Steely Dan). Belos vocais em harmonia, feitos por Ed e a cantora Alma Thomas. O solo jazzístico de Rhodes do lendário Campello faz a ponte com o disco anterior de Ed, Perpetual Gateways. E aliás é uma tônica do novo disco: todas as músicas estão recheadas de solos com linguagem jazz.
The Required Dress Code
A primeira música deste disco a ser lançada oficialmente recupera o ponto iniciado no disco AOR (LAB 344, 2013), com o estilo evidenciado pela bateria firme de Sergio Melo, pelas guitarras harmonizadas de Ed e Thiago Arruda, pelo piano de Glauton Campello, e pelos contrapontos dos teclados, todos pilotados por Ed.
X1 in Test
Ed Motta sempre reserva espaço no seu vasto baú de ideias para faixas com enredos policiais e temáticas detetivescas. “X1 in Test” segue a linha de “Fox do Detetive”, “Nicole Versus Cheng” e “Marta”. Musicalmente, começa mostrando o escaninho Westcoast AOR (com a cozinha firme de Paulo Cesar Barros e Sergio Melo), e evoluindo para um clima mais grandioso e denso, graças às guitarras e arranjos de Alexandre Carvalho, e à direção vocal grandiosa de Ed no interlúdio do tema. Já o solo de guitarra com intenção bluesy ficou a cargo de Thiago Arruda.
The Tiki’s Broken There
Talvez a música mais experimental do álbum, “The Tiki’s Broken There” tem dueto de Ed com a cantora Cidália Castro e evoca a dupla Jackie and Roy, obviamente com um viés mais profundo e contendo vocabulário mais complexo harmonicamente. Os solos de guitarra jazz de Alexandre Carvalho e de clarone (bass clarinet) do músico Ademir Junior carimbam o espírito sofisticado do tema.
Your Satisfaction Is Mine
Dialogando com “Keep On” (da banda D-Train), música que consta do repertório do show ‘Baile do Flashback’ que Ed Motta vem fazendo nos últimos anos, “Your Satisfaction Is Mine” é um regresso (tão aguardado por muitos) de Ed ao disco funk. O baixo synth e as guitarras malandras tocadas por Ed, a bateria tight, o solo synth de Michel Limma e os vocais harmonizados entre Mr. Motta e Alma Thomas reafirmam, com aplicado apuro, que Ed sabe sempre fazer música para dançar sem macular o contrato com a perfeição harmônica e o cuidado artesanal com o arranjo. Fãs de boa música pop poderiam comentar que há um quê de Michael Jackson arranjado por Quincy Jones! Talvez a última vez que Ed trilhou este caminho foi em “Pé na Jaca” (do disco Piqueninque).
Shoulder Pads
A última música do disco, “Shoulder Pads” (ombreiras em português) é uma declaração de amor irônica de Ed para o clima exagerado dos anos 80. Inspirada em Toto, a faixa, com bateria pesada de Sergio Melo, está repleta de guitarras (tocadas por Vinicius Rosa), inclusive com um solo cheio de gás. O baixo e demais instrumentos ficaram por conta do próprio Ed. A letra, lembrando vários gadgets e costumes oitentistas, como VCR (vídeo cassete), walkman, jaquetas com ombreiras e mullets, mistura as lembranças juvenis de Ed com o estilo soft rock excêntrico que permeou a década dos excessos.
Analisando a qualidade e o tratamento de áudio de
“Criterion of the Senses”
por Alexander Pindarov
Discos de referência:
The Power and the Glory – Gentle Giant - Blu-Ray Edition
Hotel California – The Eagles (40th Anniversary Edition) CD
Criterion of the Senses realmente chega ao que o título propõe: Aguçar os sentidos, principalmente a audição.
Contando com uma mix equilibrada, parece um disco da Blue Note cuja masterização primorosa do Carlos Freitas me fez fazer comparar não com uma cópia em CD, que normalmente apresenta um som mais duro, mas sim com um Blu-Ray masterizado por um dos papas do momento: Steven Wilson, que também remasterizou recentemente o “This Was” do Jethro Tull.
Um dos aspectos mais interessantes da mix é a percepção estéreo com a qual Ed Motta brinca a todo momento, sem que seja irritante. Usa com parcimônia e sutileza, como de praxe. ;)
Comparei com o o CD “Hotel California” pois, mesmo sendo remasterizado pelo papa Bernie Grundman, tem uma distorção de fase irritante nos címbalos e que no disco do Ed foi muito bem resolvido.
‘Shoulder Pads’ me lembra uma música do Deep Purple e, talvez para manter a coerência sônica, não foi acometida do mal dos discos atuais, que é o excesso de volume e equalização.
Todo o disco está perfeito, sem estalos ou ruídos e a voz do Ed está bem clara, límpida sem distorções.
'The Required Dress Code' é a primeira música do álbum 'Criterion of the Senses' de Ed Motta que já foi disponibilizada nos principais aplicativos de música (Spotify, iTunes, etc).
O lançamento do disco completo está marcado para 21 de setembro de 2018.
Ouça a faixa no link abaixo:
Ed Motta faz coletânea para o exterior e mostra um outro Brasil
By Magnum Freire - 6/05/2018 08:19:00 AM
A pedido de um selo
alemão, 'Too Slow To Disco' é elogiada pela crítica internacional ao mostrar
intersecção estética entre Biafra, Roupa Nova, Filó Machado e Jane Duboc, nomes
que brilharam nas rádios FM dos anos 80
05 Junho 2018 |
06h01
Assim que
decidiu atender ao pedido de produtores alemães para criar um álbum com o que o
final dos anos 1970 e quase todos os de 1980 produziram de melhor em música de
rádio FM romântica no Brasil, Ed Motta foi ao próprio santuário, logo ali, a um
palmo da cama. Investigou a coleção de 30 mil discos que toma as paredes de seu
apartamento no Jardim Botânico – basicamente tudo o que existe a seu redor,
tirando a TV, o banheiro e a cozinha – e puxou um álbum de fundo azul com um
jovem de calça jeans sentado no chão e um nome grafado em amarelo: Biafra
A coletânea
encomendada para o mercado europeu com o nome de Too Slow To Disco saiu no
exterior em CD, vinil e Spotify com críticas elogiosas. A publicação britânica
Record Collector a considerou a “reedição do mês” e os sites especializados
foram atrás com avaliações entre quatro e cinco estrelas, no início de um
movimento curioso. Depois de Biafra e sua Leão Ferido, entraram Filó Machado e
sua Quero Pouco, Quero Muito; Roupa Nova, com Clarear; Banda Brylho, com Joia
Rara; Jane Duboc, com Se Eu Te Pego de Jeito; Kiko Zambianchi, com Estreia; e
Guilherme Arantes com Coisas do Brasil (a lista com todas está ao lado).
E o que há de
novo nessas velhas canções? Primeiro, o fato de estarem todas elas em uma
compilação brasileira fazendo sucesso na Europa. Desta vez são eles, muitos
nomes que a própria opinião crítica no Brasil ainda tem dificuldades em
reconhecer como produtores de uma música popular relevante, e não Jorge Benjor,
Mutantes, Tim Maia, João Gilberto ou Tom Jobim, a desenhar um Brasil pop de exportação.
Segundo, ter um fio ligando Filó Machado a Roupa Nova, com pontos em Rita Lee e
Roberto de Carvalho, Cassiano e Altay Veloso, é um ensinamento aos ouvidos que
deixaram se levar pela máxima de que não havia inteligência nas rádios FM dos
anos 80.
Biafra estava
lá em 1981. A canção Leão Ferido, feita por ele e Dalto, foi uma das que mais
tocaram no ano a partir da Rádio Cidade do Rio. Aqui, sua imagem criada
sobretudo em programas de auditório o associaria a uma cantor pop que
praticamente enterraria a destreza harmônica de Leão Ferido. Lá fora, os
europeus piraram. “Isso acontece porque eles, fora do País, só ouvem a música,
sem imagem ou filtro algum da época. É apenas a música”, diz. “Foi um momento
em que podíamos ser sofisticados e populares ao mesmo tempo, como foram os
Beatles.” No time que o acompanha na gravação, nomes dignos de seleção: Lincoln
Olivetti, o papa da década, nos teclados; Robson Jorge na guitarra; Paulo Braga
na bateria; e Serginho Trombone.
Na outra ponta
da história, Filó Machado aparece com Quero Pouco, Quero Muito, música sua para
letra de Judith de Souza, de seu disco Origens, de 1983. Filó, então com 32
anos, já era uma potência criadora de ritmos ao violão e de um pensamento
harmonizador impressionante que lhe garantia respeito no meio, mas que não
parecia suficiente para aproximá-lo de um público maior. Seu filho Marcelo, com
9 anos, faz a contagem e a música começa nas alturas, com a parte instrumental
executada pelo Placa Luminosa. Uma apresentação para os músicos e executivos de
gravadoras em Canela, no Rio Grande do Sul, rendeu um fã inusitado. “Jamelão.
Depois de me ouvir tocar essa canção com a banda, veio me abraçar todo
emocionado.” Ed Motta define Filó como “o mergulho mais profundo da piscina”,
que o Brasil “criminosamente não conhece nem um terço”. Ele diz que decidiu
abrir a coletânea com sua música para, propositalmente, fazer os ouvintes
perceberem o artista logo no início. “Não é ajudá-lo. Ele é que me ajudou a
chegar à música que eu tenho hoje.”
- FILÓ MACHADO – Quero Pouco, Quero Muito
- SANDRA SÁ – Guarde Minha Voz
- ALTAY VELOSO – Débora
- JUNIOR MENDES – Copacabana Sadia
- DON BETO – Renascendo Em Mim
- LUCINHA TURNBULL – Toda Manhã Brilha O Sol
- GUILHERME ARANTES – Coisas Do Brasil
- CARLOS BIVAR – Maré
- BIAFRA – Leão Ferido
- SANTA CRUZ – Mais Uma Chance
- JANE DUBOC – Se Eu Te Pego De Jeito
- CASSIANO – Rio Best-Seller
- CARLINHOS & SONINHA QUEIROZ – Pra Você
- GELSON OLIVEIRA & LUIZ EWERLING – Acordes E Sementes
- ZECA DO TROMBONE – Rota-Mar
- ROUPA NOVA – Clarear
- KIKO ZAMBIANCHI – Estréia
- BRYLHO – Jóia Rara
- RITA LEE & ROBERTO – Atlântida
O que fazem esses
artistas é algo que os europeus, japoneses e norte-americanos chamam de AOR,
uma sigla que em tradução livre não explica tudo: album-oriented radio, ou
disco orientado para tocar nas rádios românticas das madrugadas. Assim, os
estrangeiros levam muito a sério também artistas como Christopher Cross, Doobie
Brothers, Lionel Richie, Manhattan’s e muito do que começa a entrar na
programação de emissoras como, em São Paulo, Alpha FM e Antena 1, a partir das
22h. As love songs equivalem no exterior às pop bossa no Brasil, mas tudo é
chamado de AOR, um setor para o qual qualquer artista pode entrar mesmo sem
saber exatamente o que significa.
A seleção de Ed
Motta tem, por exemplo, algo que pode estar no limite do AOR brasileiro.
Atlântida, 1982, de Rita Lee e Roberto de Carvalho, é classificada em sites de
pesquisa internacionais como “latin, funk, soul”. Não está entre as músicas
mais tocadas da dupla, mas foi o que parou na rede de Ed Motta. “Sei que eles
nunca fora de escutar Steely Dan, mas essa música parece ter saído de lá”,
arrisca Ed. Roberto de Carvalho confirma as suspeitas, ele e Rita não ouviam
Steely Dan. “Acho que eu nunca ouvi muito nada”, diz, para se refazer. “Ouvi
Stones e, antes, Beatles e Jimi Hendrix, mas nunca soube muito de AOR.” Antes
que Atlântida tivesse a base eletrônica reta, ele diz que tentou fazê-la ganhar
uma segunda parte de tango. “A bateria não era como ficou, mas o tango não dava
certo, quebrava muito, e aí ficou a bateria reta mesmo.”
O típico AOR
Coisas do Brasil salvou Guilherme Arantes de um destino talvez menos glorioso.
Por um lado, os roqueiros que o conheciam do grupo Moto Perpétuo cobravam dele
postura rock and roll. Por outro, depois de Cheia de Charme, em 1985, a
gravadora CBS queria transformá-lo em um galã romântico, submetê-lo a um
“projeto Julio Iglesias”. “A palavra rock me perseguiu como uma peste, e Coisas
do Brasil representou minha vitória diante dessa peste. Depois de ouvir sua pop
bossa, Tom Jobim, que nunca saberia o que era o tal do AOR, falou ao seu ouvido:
‘Arantes, você é um batuta... Essa aí eu também queria ter feito, rapaz’.”
Too Slow To Discohttps://tooslowtodisco.myshopify.com/
Hypochondriac's Fun - Ao Vivo no Yamaha Montage Festival
By Marcelo Donati - 3/24/2018 05:04:00 PM
Confiram abaixo a música Hypochondriac's Fun, que foi um dos temas do pocket show que Ed Motta realizou no Festival Yamaha Montage, dia 6 de fevereiro de 2018.
O show completo foi postado no canal do Youtube da Yamaha, cujo link está aqui.